Pastor Bonus

27º Domingo do Tempo Comum

O povo de Jesus conhecia muito bem a imagem da vinha. Por isso ela foi usada várias vezes por Deus nas Sagradas Escrituras para falar da sua relação com o seu povo. 

Na primeira leitura ouvimos um cântico sobre a vinha, no salmo se escutou como que uma oração feita pela própria vinha e por fim, no evangelho, uma parábola sobre os vinhateiros homicidas. 

O Papa Bento XVI, no Livro “Jesus de Nazaré”, ao explicar esta parábola lembra que o primeiro sentido é justamente o da rejeição da mensagem de Cristo pelos seus contemporâneos e o ponto máximo dessa rejeição que é a cruz

Mas, recordava ainda o pontífice, essa parábola fala também dos nossos dias. Nestes tempos em que se declara que “Deus morreu” e, desta maneira, o homem pode “ocupar o seu lugar”. 

Falemos, pois, sobre esses dois sentidos que podemos recolher desta alegoria da vinha, apresentada nas leituras bíblicas deste domingo: (1) o primeiro seria o seu sentido geral e (2) o segundo o sentido particular. Nesse último ponto apresentemos também alguns considerações espirituais.

1. Sentido Geral: A vinha é o Povo de Israel 

O dono da vinha, lembra o profeta, escolheu o melhor lugar, cercou-a, cuidou dela e, antes mesmo começasse a dar frutos, ele construiu um lagar já contando com os seus frutos. Investiu muito nela, pois era impossível que depois de tanto cuidado não desse uvas boas.

A vinha cuidada por Deus com tanto carinho é o Povo de Israel.E essa alegoria, como a do casamento, é uma comparação sobre a relação entre Deus e o seu povo. Deus sempre ousou confiar muito em Israel, mas por eles foi esquecido, abandonado e até traído. A vinha é o povo de Israel que não correspondeu aos propósitos divinos. 

É muito triste quando o amor não é correspondido. Isso aconteceu e acontece com Deus, que é enamorado pelo seu povo, mas é muitas vezes por ele rejeitado. E vejam, como Deus cuida de nós! Quantos sinais do seu carinho e de sua proteção! Mas ao invés de amá-lo, gastamos o nosso amor onde não deveríamos. 

Jesus, nos Evangelhos, usou cinco vezes dessa alegoria, a da vinha. Na parábola de hoje Ele retoma este cântico da profecia de Isaías, mas agora de uma maneira diferente: fala dos que tinham arrendado a vinha

Os vinhateiros, conta-nos Nosso Senhor, não só desprezaram os enviados do dono da vinha, mas chegaram ao cúmulo de matar o herdeiro. Eis diante de nós o mistério da Cruz! O povo de Israel, que Deus tanto amou, não soube reconhecer a presença do Filho de Deus e o crucificaram. 

2. Sentido Pessoal: a vinha é também a Igreja e a minha Alma 

Seria muito pouco se só observássemos esse primeiro sentido. É preciso reconhecer que existe uma mensagem específica para nós e para o nosso tempo. Por isso falemos sobre um outro sentido.

a) A vinha é a Igreja

A vinha nas Sagradas Escrituras é também a imagem da Igreja. E aprendamos bem: essa vinha, a Igreja, nunca será rejeitada por Deus, porque a Igreja é o Corpo de Cristo. Pode ser que nós, os ramos, não estejamos unidos a essa vinha e por isso mesmo “jogados fora”. 

b) A vinha é minha alma 

A vinha também significa a nossa alma. Porque Deus nos plantou na sua Igreja, nos enxertou em Cristo, nos poda e nos dá os alimentos necessários, Ele tem o direito de nos pedir frutos! E bons frutos! 

Que não sejamos com a vinha descrita pelo profeta, que ao invés de dar uvas suculentas, deu uvas selvagens, azedas. E o que são esses frutos amargos senão os nossos pecados? E os pecados, por sua vez, estão todos eles intimamente ligados à crucificação de Nosso Senhor. 

Na imagem dos vinhateiros homicidas não estão somente os responsáveis diretos da morte de Jesus, mas também os nossos pecados e os de toda a humanidade. O pecado nada mais é do que a tentativa de “eliminar” Cristo. É pensar que “matando Deus” o homem pode-se assumir como proprietário de suas vidas e da obra da criação. 

Além disso, quantas vezes também vemos Jesus sendo “expulso” da cultura, dos ambientes públicos, das escolas e até mesmo das famílias. Mas, prestemos bem a atenção nesta consideração: quando os homens tiram Deus de suas vidas e da sociedade o que vemos é injustiça, violência e todo tipo de selvageria e barbárie. 

Por isso é oportuno nos pergunta: o que faço com os “empregados” que o Senhor me envia? Esses mensageiros são, por exemplo, a leitura da Bíblia, as pregações e as homilias que ouvimos. Essas que são as “visitas” de Deus à vinha que é a nossa vida. Eu os acolho ou os rejeito? 

Devemos temer o que disse Nosso Senhor, no final do Evangelho: “O Reino de Deus vos será tirado” (Mt 21, 43). Porque pode acontecer de perdemos a vida divina que recebemos no batismo. 

Para não acontecer isso preciso converter todas as realidades de nossa vida em fruto bom. Tudo em nossa volta pode e deve ser santificado e oferecido ao Senhor. São várias as oportunidades ao longo do dia de fazer brotar boas uvas, pois, disse o Senhor: “Quem permanece em mim dá bons frutos” (Jo 15, 5-8). 

Mas não nos desesperemos. Foi pensando nas dificuldades que enfrentamos, inclusive para produzir bons frutos, que nos lembrou o apóstolo: “Não vos inquieteis com coisa alguma, mas apresentai as vossas necessidades a Deus (Fl 4, 6).

Hoje, irmãos, mais uma vez o Pai nos enviará de novo seu Filho. E hoje Ele virá a nós escondido no pão e no vinho. Na parábola, ao enviar seu filho, o dono da vinha pensou: “Ao meu Filho eles vão respeitar” (Mt 21, 37). Que todas as vezes em que nos aproximarmos da Eucaristia acolhamos Nosso Senhor com muito amor e respeito!

Concluamos com a belíssima oração de compromisso que rezamos hoje com o salmista: “Nunca mais vos deixaremos, Senhor Deus, dai-nos vida e louvaremos o vosso nome” (Sl 79, 19). 

(Pe. Anderson Santana Cunha)

TEXTOS PARA MEDITAÇÃO

“Em sentido moral, a cada um se entrega sua vinha para que a cultive, ao ser-lhe administrado o Sacramento do Batismo, a fim de que trabalhe por meio dele. É-lhe enviado um servo, outro e um terceiro, quando a Lei, o Salmo e a profecia falam, e em virtude de cujos ensinamentos deve-se agir bem. Mas o enviado é morto e lançado fora, se despreza a sua pregação ou, o que é pior, se blasfema contra ele. Mata o herdeiro que traz em si todo aquele que ultraja o Filho de Deus e o ofende o Espírito de sua graça. Uma vez perdido o mau cultivador, a vinha é entregue a outro, como acontece com o dom da graça, que o soberbo menospreza e o humilde recolhe” (São Rábano Mauro, Commentariorum in Matthaeum, L. VI, c. 21: ML 107, 1053). 

“Após três dias de [Jesus] ter se referido a esta história, resultou verídica. Os guardas da vinha, como Anás e Caifás, o levaram para fora da cidade, a uma colina, e o sentenciaram a morte. Como disse Santo Agostinho: “o matarão para poder tomar posse da herança, mas ao perpetrar a sua morte, perderam a herança”. (…) Os bons se arrependem ao conhecer seus pecados; os maus se encolerizam ao ser descobertos. A ignorância, contrariamente ao que sustentava Platão, não é a causa do mal; tão pouco é a educação a que consegue suprimir o mal. Aqueles homens possuíam inteligência e vontade, um saber e um propósito. Mas é possível conhecer a Verdade e odiá-la, conhecer a Bondade e crucificá-la.” (Fulton Sheen, Vida de Cristo, Ed. Herder, 1968, p. 299).

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