A cada domingo nós temos a alegria de ouvir Nosso Senhor que forma o nosso coração de discípulo e nos ensina a imitá-lo. Sim, ser cristão é imitar Cristo, por isso recebemos esse nome em nosso batismo. Ser cristão não é uma decisão fácil, porém não há outra opção mais feliz. Trata-se de uma escolha que se renova sempre, que deve ser sempre acompanhada pelo nosso firme propósito de viver a vida de Cristo na nossa.
Com os discípulos, continuamos aos pés da montanha, ouvindo os divinos ensinamentos daquele belíssimo sermão que tem iluminado os nossos domingos. Se no domingo passado o Senhor se referia aos mandamentos (precisamente ao 5º, ao 6º e ao 8º), no Evangelho que foi proclamado fala de algumas normas que se referiam à justiça.
Hoje há dois desafios (ser cristão é desafiador!) que nos são apresentados pelo Senhor:
1º desafio: Pagar o mal com o bem
Pode parecer um pouco bárbara essa lei do “olho por olho”, mas é na verdade uma evolução muito importante na história da humanidade. Com essa lei, que está na Bíblia (cf. Lv 24,19-20), se colocava limite no excesso da vingança, que geralmente era desproporcional. Chama-se Lei do Talião porque “talis” em latim significa “tal”: assim ele fez, assim será feito com ele.
Além de evitar a escalada da violência, essa lei era um modo de tornar “mais justa” a convivência entre as pessoas. É um pouco parecido com o formato jurídico de nossas leis penais: existe uma proporcionalidade entre o crime e a condenação, a pena.
Porém para um cristão isso não basta. Somos chamados a um passo mais ousado. A lei de Cristo supera a lógica humana, vai além da simples justiça humana, vai até na renúncia dos nossos direitos. A proposta de Jesus é resumida muito bem por São Paulo que disse: «Não te deixes vencer pelo mal; pelo contrário, derrote o mal com o bem» (Rm 12, 21). Assim se vence a sede de vingança, com o perdão. O amor é mais forte que o ódio.
Talvez se alguém nos questionar se somos vingativos diremos que não. Porém alguns tipos de pensamento muito comuns estão dentro desta lógica: “quero que pague na mesma moeda”, “aqui se faz, aqui se paga”. É preciso estar atento a esse tipo de pensamento para que não domine sobre o nosso coração a lei da vingança.
2º desafio: Amar ao inimigo
A palavra “ódio” usada no evangelho é um semitismo (é um jeito do povo de Jesus falar), pode significar o “ódio” como nós conhecemos (no sentido de fazer o mal), mas pode (o que é mais provável nesse caso) significar “não amar”, “não está em primeiro lugar”. A lei dizia que você não tem obrigação de amar seu inimigo. Jesus diz diferente: o cristão tem que amar!
Dentro desse grupo de “inimigo” de que fala Jesus estão todas aquelas pessoas que de uma forma ou de outra não nos fazem bem. E nem sempre se trata de pessoas que vivem longe, mas daquelas que encontramos talvez dentro de casa, no trabalho, no relacionamento cotidiano.
Mas atenção, isso não quer dizer que somos obrigados a viver de “sorrisinhos” com que nos faz mal. Jesus não se comportava assim com aqueles que o perseguiam. Uma coisa é a amizade, outra coisa é o amor que “devemos” a todos como cristãos.
Não somos obrigados a ser amigos de ninguém, mas amar sim! Assim o cristão deve tratar bem a todos, inclusive aqueles que nos fazem mal (aqueles que gritam, que humilham, que perseguem, que caluniam…). Quando se está diante de uma pessoa que te trata mal não há melhor freio para o seu ódio do que tratá-la bem e educadamente.
Por isso, eis alguns conselhos que podem nos ajudar em relação aos que nos fazem mal (que nos odeiam). Se não foi possível resolver a situação no diálogo e no pedido de perdão, três atitudes são importantes:
– rezar por quem te fez (o faz) o mal, para que o Senhor lhe faça feliz, lhe converta o coração;
– não falar mal daquela pessoa, principalmente quando alguém começa a enumerar os seus erros e a “língua coçar” de vontade de dizer o que você sabe de ruim a respeito dela;
– Pedir ao Senhor a graça de que se um dia aquela pessoa precisar de você, que você esteja disposto a ajudar.
Tudo isso que nos ensina o Senhor não é fraqueza; o cristão não é um fraco – como dizem alguns filósofos – muito pelo contrário, o cristão é forte, porque é capaz de diante de ofensa e da perseguição dar um resposta que é capaz de silenciar o mal, de bloquear o ódio, de florecer amor.
Maria, mãe da ternura, rogai por nós!
(Pe. Anderson Santana Cunha)
Textos para meditação
01 | “Amar porque somos amados”, eis o segredo! Porque fizemos a experiência do amor infinito de Deus, que tem grande paciência conosco, e perdoa os nossos erros, somos convidados a espalhar por todo o canto a presença da misericórdia e da bondade.
02 | «Um discípulo de Cristo nunca tratará ninguém mal; Ele chama um erro de erro, mas aquele que está errado deve ser corrigido com carinho; se não, não o poderá ajudar, não o poderá santificar» (São Josemaria Escrivá, Amigo de Deus, 9).
03 | «Exatamente esta página evangélica é considerada a magna carta da não-violência cristã, que não consiste em entregar-se ao mal segundo uma falsa interpretação do “oferecer a outra face” (cf. Lc 6, 29) mas em responder ao mal com o bem (cf. Rm 12, 17-21), quebrando dessa forma a corrente da injustiça. Então, compreende-se que a não-violência para os cristãos não é um mero comportamento táctico, mas um modo de ser da pessoa, uma atitude de quem está tão convicto do amor de Deus e do seu poder, que não tem medo de enfrentar o mal somente com as armas do amor e da verdade. O amor ao inimigo constitui o núcleo da “revolução cristã”, uma revolução baseada não em estratégias de poder económico, político ou mediático. A revolução do amor, um amor que definitivamente não se apoia nos recursos humanos, mas é dom de Deus que se obtém confiando unicamente e sem reservas na sua bondade misericordiosa. Eis a novidade do Evangelho, que muda o mundo sem fazer rumor. Eis o heroísmo dos “pequenos”, que crêem no amor de Deus e o difundem até à custa da vida». (Bento XVI, Angelus, 18 de fevereiro de 2007).